Levantamento da Abrasel aponta que profissionais em bares e
restaurantes são, em sua maioria, pretos ou pardos; formalização e qualificação
são desafios
Com 1,5 milhão de
empresas em operação, o setor de alimentação fora do lar se destaca pela sua
diversidade, tanto no público que atende quanto nos profissionais que emprega.
Dados recentes mostram que, embora ainda existam desafios a serem superados, há
um movimento crescente em prol da representatividade e da equidade racial.
Iniciativas que promovem a inclusão têm ganhado força, seja por pressão dos
consumidores ou pela conscientização dos empreendedores, indicando um caminho
promissor para o setor.
Dados recentes levantados pela Abrasel, a partir da Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) do IBGE, mostram
que 63% da mão de obra do setor é composta por pretos e pardos.
Há uma percepção de movimentação crescente em prol tanto da diversidade,
quanto da equidade social, em uma oportunidade de transformar o setor de
alimentação fora do lar em um exemplo de mudança estrutural e valorização do
talento humano.
Negros em espaço de poder
Para melhorar esse quadro, a ausência de pessoas negras ou
pardas precisa ser observada em todos os cenários. É isso o que ponta a autora
Djamila Ribeiro, em seu livro Pequeno Manual Antirracista.
“A ausência ou a baixa incidência de pessoas negras em
espaços de poder não costuma causar incômodo ou surpresas em pessoas brancas.
Para desnaturalizar isso, todos devem questionar a ausência de pessoas negras
em posições de gerência, autores negros em antologias, pensadores negros nas
bibliografias de cursos universitários, protagonistas no audiovisual”.
Inclusive, o próprio o setor de Alimentação Fora do Lar é citado
como um exemplo pela autora. "Pessoas brancas, por exemplo, devem
questionar por que em um restaurante, muitas vezes, as únicas pessoas negras
presentes estão servindo mesas”, diz.
Como evoluir?
A analista de Recursos Humanos, Caroline Teixeira, acredita que o cenário atual
para diversidade racial em cargos de gerência, atendimento e administração em
bares e restaurantes tem avançado, mas ainda enfrenta muitos desafios.
Para ela, o aumento da diversidade é reflexo das pressões
externas do público, da mídia e das novas políticas de governança, o que acaba
influenciando os donos destes estabelecimentos a buscarem por mais diversidade,
inclusive em espaços de liderança. Isso significa que “para os restaurantes se
manterem competitivos, é preciso abraçar a diversidade como parte do seu
posicionamento”.
Desenvolvendo talentos
Para que se construa mais estabelecimentos no setor com
lideranças negras, é necessário que a mentalidade
focada na diversidade venha das pontas mais altas da gestão. Caroline destaca
que este é um processo cultural, no qual há a necessidade de uma prática
continua.
“Para promover mais inclusão e equidade nos quadros de
liderança, bares e restaurantes precisam começar analisando suas políticas
internas. Antes mesmo de pensar em divulgar vagas específicas para pessoas
negras, é essencial garantir que a empresa possua um ambiente que apoie de
forma genuína a diversidade”, orienta.
A criação de uma cultura mais diversa é um fator importante
para a criação de uma identificação com o público-alvo dos bares e restaurantes
que, muitas vezes, possui perfis diversos.
“Promover diversidade não é só uma questão social, mas
também estratégica. Negócios que investem nisso criam um ambiente mais
acolhedor, se conectam melhor com seus clientes e fortalecem a imagem da marca.
A inclusão precisa ser um compromisso diário, e não apenas uma resposta à
pressão externa”, destaca.
Liderança e diversidade racial
Apesar de ser um segmento composto, em sua maioria, pela população
negra, ainda existe o desafio de legitimar esses profissionais como líderes. A
confeiteira Ariana Bentos, proprietária da Bentos Confeitaria, localizada na
cidade de Lavras, em Minas Gerais, expressa que “ainda é difícil. “T, temos
pouquíssimas pessoas negras em cargos de liderança. Para variar, o nosso
esforço para ter algo ou algum cargo alto é quase dobrado”.
Para a empreendedora, a luta permeia muitos caminhos, da
construção da imagem de líder no próprio estabelecimento até a relação com os
clientes. Apesar disso, ariana avalia que o cenário tem mudado, e a ocupação de
pessoas negras em espaços de liderança tem aumentado. Entretanto, ainda enfrenta
barreiras.
“Estamos acostumados a nos ver somente servindo, sem ocupar
posições de lideranças, mas sim sendo garçons ou faxineiras. No entanto, isso
está mudando aos poucos, a passos bem lentos, mas está. Quando vejo um preto bem-sucedido
e bem colocado, sinto um orgulho danado, a gente vê e sente a luta que nós
passamos todos os dias”.
Ela ainda diz: “Temos muita luta pela frente e o que eu falo
sempre para qualquer pessoa preta que começa a trabalhar aqui é para investir
em estudo, ainda que não goste. Busco motivá-los a aprender, empreender e a se movimentar,
porque nossa luta é dobrada”, finaliza.